O LIXO DO CAPIBARIBE
Clóvis Campêlo
Leio no Diário de Pernambuco que a ONG Recapibaribe, em apenas três horas de ação, retirou do rio Capibaribe, no centro do Recife, nada menos do que 1,3 toneladas de lixo. A entidade pretende reciclar o que for possível nesse material recolhido e doá-lo à instituições de caridade.
Se lhe parece muito essa quantidade de lixo recolhido na nossa Veneza Brasileira em apenas três horas, fique sabendo que em Londres dois barcos percorrem o rio Tâmisa recolhendo 30 toneladas de lixo por dia. O rio inglês, aliás, no século XIX, era conhecido como “o grande mau cheiro”. Segundo matéria publicada no site da Globo em 2012, eram comuns naquela época as epidemias de cólera na capital inglesa, e as sessões do Parlamento, que fica na margem do rio, tinham que ser suspensas quando o vento fazia o odor chegar às salas do prédio. Para reverter essa situação, as autoridades inglesas e londrinas construíram várias estações de tratamento de esgoto ao longo dos anos, além de criarem vários outros mecanismos de monitoramento e controle do lixo que chega ao rio. Hoje, revitalizado, o Tâmisa possui mais de 120 espécies de peixes catalogados, além de mais de 400 espécies de invertebrados. Um exemplo a ser seguido, principalmente por nós, recifenses, que vivemos numa cidade construída e mantida por sobre as águas do Rio Capibaribe e de outros rios menores.
Ainda segundo a matéria do Diário de Pernambuco, até o mês passado, a Emlurb retirava a cada dois meses cerca de 20 toneladas de resíduo sólido do rio, providencia hoje suspensa por encerramento do contrato com a firma terceirizada.
No lixo recolhido pelo trabalho voluntário da ONG, foram encontrados, além das garrafas e sacolas plásticas, muitos brinquedos e objetos poucos usuais, como um vibrador elétrico, uma buzina de pipoqueiro, uma cabeça de touro empalhada e um papagaio de hospital. Segundo Maria do Socorro Cantanhede, dirigente da Recapibaribe, em um ano de trabalho voluntário a instituição já recolheu cerca de 600 toneladas de lixo. Chama a atenção, porém, para os esgotos, segundo ela o principal poluidor do rio.
O Rio Capibaribe, que na língua tupi significa “no rio das capivaras”, nasce na Serra do Jacarará, no agreste do Estado de Pernambuco, na divisa dos municípios de Jataúba e Poção. Tem 240 quilômetros de extensão e banha 42 municípios, a maioria dos quais despeja nas suas águas os dejetos dos esgotos. Tem 74 afluentes e os reservatórios da sua bacia têm uma capacidade máxima acima de 1 milhão de metros cúbicos. Atravessa o Recife, banhando vários dos seus bairros, como Várzea, Caxangá, Apipucos, Casa Forte, Torre, Capunga, Madalena, Derby e Ilha do Leite. Antes desaguar no Oceano Atlântico, encontra-se com o Rio Beberibe por trás do palácio do Campo das Princesas, no centro histórico da cidade.
É o rio dos poetas, o cão sem plumas de que nos fala João Cabral de Melo Neto. A sua história se confunde com a história do Recife, como bem o disse o sociólogo Gilberto Freyre, no Guia Prático, Histórico e Sentimental da Cidade do Recife: “O rio está ligado da maneira mais íntima à história da cidade. O rio, o mar e os mangues. Assassinatos, cheias, revoluções, fugas de escravos, assaltos de bandidos às pontes, fazem da história do Capibaribe a história do Recife”.
Cuidemos, pois, do Capibaribe!
Recife, setembro 2014
2 comentários:
Caro Clóvis
Muito bem lembrado por vosmecê o Rio Capibaribe da nossa infância (O tal rio morto, "o rio das capivaras") que era comandado às vezes pelas inundações (as cheias) e, mormente pelas marés do nosso verde atlântico que nos possibilitava por um lado ter um rio bonito para tirar postais e por outro dar o ganha pão aos necessitados caçando nas vazantes (na lama), siris e goiamuns para comer e vender amarrados em cordas e cobertos de lama do próprio rio como se fosse a melhor defesa para conservação da frescura destes habitantes da lama.
Bom ter lembrado esse nosso rio que passávamos quase todo dia junto dele e não dávamos importância nenhuma. Agora você deu,
Um abraço.
Paulo
Este rio não sensibiliza mais os poetas, só as dragas.
O Ribe Capivara não é o Tâmisa, onde as questões ambientais e de saúde são levadas a sério e se dá continuidade aos projetos implantados.
Desde criancinha eu escuto a conversa de desassoreamento, aumento do calado, implantação de linhas de transporte fluvial regulares, turismo, e coisas desse tipo. Este último projeto, passada a Copa, já foi esquecido. Mas... o Recife é a cidade das promessas
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