sábado, 19 de janeiro de 2013

Caboclos de lança





CABOCLOS DE LANÇA


Fotografias, montagens e pesquisa de textos de Clóvis Campêlo

Os caboclos de lança integram os maracatus rurais, também chamados de maracatus de baque solto ou maracatus de orquestra.
Segundo a escritora Virgínia Barbosa, em pesquisa publicada no site da Fundação Joaquim Nabuco, até a década de 1920, os caboclos de lança não despertavam tanto interesse e nem fascinavam as pessoas. Na sua maioria, eram trabalhadores das lavouras de cana-de-açúcar que viviam e desfilavam nas cidades interioranas de Pernambuco. A partir da década de 1930, no entanto, com a decadência dos engenhos banguês, o crescimento das indústrias e a modernização da economia, esses trabalhadores passaram a se deslocar do campo para as zonas urbanas das cidades litorâneas, notadamente da capital do Estado, trazendo consigo essa tradição cultural.
Embora a origem do maracatu rural ainda seja desconhecida, alguns pesquisadores acreditam que ele tenha surgido devido à mistura de vários elementos das culturas indígenas e africanas e de outros folguedos, como cambinadas, bumba-meu-boi, cavalo-marinho, caboclinhos, folia de reis, etc. Os caboclos de lança, que também são conhecidos como lanceiros africanos, caboclos de guiada ou guerreiros de Ogum, integram o maracatu de baque solto ao lado de outras figuras como o mateus, a catirina, a burrinha, o babau, o caçador, baianas, damas de buquê, a dama do paço, calungas e caboclos de pena.
Os caboclos de lança se submetem a um verdadeiro ritual, antes de saírem para as ruas durante o carnaval. Primeiro, abstinência sexual completa, que começa na sexta-feira anterior ao início do carnaval e vai até a quarta-feira de cinzas. Para não “abrir o corpo” e aumentar as suas defesas, o caboclo também não toma banho durante esses dias, obrigando-se a dormir sujo, do jeito que veio da rua. Existem ainda, antes da saída dos caboclos para o carnaval, cerimônias realizadas em terreiros, com a benção da lança e da flor, que carregam na boca, e com a tomada do azougue, coquetel preparado com pólvora, azeite e cachaça.
Suas vestimentas são formadas pelo chapéu de palha, ornamentado com fitas onde predomina a cor do seu guia espiritual; um lenço colorido, colocado no pescoço; uma grande gola coberta de lantejoulas, que cobre os ombros, o peito e as costas do caboclo; a fofa, calça frouxa com franjas; o surrão, uma armação com chocalhos que o caboclo carrega nas costas; os óculos escuros e uma flor presa nos lábios, geralmente um cravo branco.
O destaque especial é a lança de madeira, feita de imbiriba ou quiri, com dois metros de comprimento, cortada por eles mesmos na mata, assada e enterrada na lama por quatro a cinco dias, para endurecer; depois descascada e afilada na ponta de quatro quinas e coberta de fitas coloridas, com cerca de 60 cm, cada, consagradas e batizadas em um terreiro de umbanda, com rezas e defumadores.

Recife, 2011

2 comentários:

Samuel da Costa disse...

O sul tão europeu, não tem dessas coisas, essa cores e esse brilho todo.

Luzilá Gonçalves Ferreira disse...

Que beleza. Tenho uma lembrança da visão de dois caboclos de lança surgindo no meio do canavial, perto de Nazaré, numa manhã de carnaval.