terça-feira, 7 de maio de 2013

Narciso moderno


NARCISO MODERNO

Clóvis Campêlo

Narciso moderno,
já não preciso de lagos,
vejo o meu rosto espelhado
em superfícies polidas.

Narciso moderno,
já não preciso ser belo,
nem morrer buscando o eterno,
nem deixar sangrar as feridas.

Nasciso moderno,
meus olhos são tubos de imagens
e em minhas veias correm
sangues intoxicados.

Narciso moderno,
já não carrego culpas
embora traga comigo
todos os sete pecados.

Narciso moderno,
sinto-me observado
pelo olhar escandalizado
dos semáforos,
sinal dos tempos de hoje.

Modernas cavalgaduras,
biônicas criaturas,
comigo disputam um espaço,
consomem o mesmo ar,
buscam uma saída.

Narciso moderno,
procuro o simulacro,
do mundo busco um retrato
vazio de emoção.

Narciso moderno,
basta-me um botão apertar
pra ver o mundo brotar
parido pela televisão.

Recife, 1990

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