CHUVAS DE AGOSTO
Clóvis Campêlo
Para nós, recifenses, inverno é sempre sinônimo de chuva. E o Recife, cidade já tão privilegiada no seu convívio com as águas, torna-se ainda mais úmida. Particularmente, nunca gostei desse tempo de chuva, embora o saiba necessário. É tudo frio e úmido ao deitar e tudo frio e úmido ao levantar.
Há quem diga que nós, recifenses, na realidade, não sabemos o que seja o frio. Podem ter razão. Mas, para nós, acostumados a uma temperatura média de 26º graus, tudo o que não seja calor será frio. E o frio é a negação do azul intenso da qual a cidade se reveste no verão. É a negação dos nossos verdes mares e da nossa morenidade curtida sob o sol da alta estação. Sob a chuva, no inverno, o Recife perde as suas cores e a sua alegria. Torna-se cinzenta, plúmbea, depressiva.
E eu, que nunca me deixei seduzir pelo sentimento do mundo e me sinto como um coqueiro encravado nas areias mornas da cidade, necessito do sol, do sal, do azul do céu para oxigenar as células e elaborar a fotossíntese da vida. O inverno chuvoso do Recife me deprime.
No calendário da minha infância, vivida na praia do Pina, agosto sempre foi o mês do ventos. Era em agosto que a chuvas começavam a declinar, levadas pelos ventos intensos do mês. Era o período de empinar papagaios e pipas nas areias ainda úmidas da praia, aguardando a chegada do verão em setembro. Naquele tempo, agosto era o mês da transição, que ainda sofria com o desbotamento invernoso. Agosto ia se colorindo aos poucos.
E quando setembro chegava, retornavam a alegria, todas as cores, todas as vozes, todos os movimentos. Restaurava-se definitivamente o verão, o calor. Setembro nos trazia a praia e a vida de volta.
Hoje, agosto ainda é chuva e falta de cores. Dizem que isso se deve ao aquecimento das águas do Oceano Atlântico, ao fenômeno do El Niño. Podem ter razão. Afinal, tudo muda ao longo do tempo e que sou eu para duvidar da sabedoria dos homens da ciência.
Dou-me ao direito, porém, como criança que fui, de discordar desse menino levado que teima em jogar para os céus as águas salgadas do oceano e fazer com que as chuvas se prolonguem além do necessário.
Não sabe ele que setembro se aproxima e que nós, recifenses, ansiamos pelo retorno do verão com a sua alegria, suas cores, vozes, movimentos?
Não sabe que ele que precisamos do sol, do sal e do azul do céu para elaborarmos a fotossíntese da vida?
Que venha setembro, restaurando a rotina do verão e trazendo o sol de volta!
O povo tropical do Recife agradece!
8 comentários:
QUE TEXTO GOSTOSO DE LER.
Adorei, Clóvis. Também sou do tempo em que agosto era mês dos ventos e setembro a chegada do verão. Detesto o frio, a não ser para dormir.
Camarada Clóvis,
não sei se você sabe, mas o sol também tem influência positiva no tratamento de depressões.
Gostei muito, Clóvis.
Grande Clóvis! Você é um poeta que escreve crônicas ou um cronista da poesia? De uma forma ou de outra, seus textos e poemas sempre tocam profundamente a alma recifense que habita em nós tropicais, recifenses, frevorosos e tementes ao frio e à melancolia das chuvas. Que os ventos de agosto soprem com mais força e nos tragam o nosso verão de volta.
Valeu, Fred. O poeta é como uma andorinha que gosta de voar e fazer verão bem acompanhado. Gosto quando você e todos os outros se chegam ao bando…
Olá Clóvis,
Adorei seu texto eu gosto do sol e da chuva.
O sol me acende , a chuva me deixa dengosa, procurando aconchego e uma dormida de conchinha.
Gosto da alternancia das estações, sempre me encantei com as mudanças. O Nordeste nos proporciona sempre esta mudança de cenario.
Meu abraço
Grato pela visita e pelo comentário, Dalinha. Talvez por ser sagitariano, eu prefira o sol. Mas sei da necessidade da chuva, do ciclo das águas. E principalmente, agora, por tomar conhecimento do dengo que ela provoca nas mulheres. Chove, chuva, chove sem parar…
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