sábado, 28 de janeiro de 2012

Os caminhos do baião



OS CAMINHOS DO BAIÃO

Clóvis Campêlo

"Eu vou mostrar pra vocês
Como se dança um baião
E quem quiser aprender
É favor prestar atenção
"

Segundo o Dicionário Cravo Albin da Música Popular Brasileira, o baião, cujo nome derivaria de "baiano", uma dança popular nordestina, em fins do século XIX já era conhecido no interior nordestino, sendo executado em sanfonas pelo sertão. Restrito e esquecido no interior nordestino, o baião se consolidaria como gênero da MPB através da dupla Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira.
Em 1946 foi gravada a música "Baião", de autoria da dupla, pelo grupo 4 Ases e Um Curinga, pelo selo Odeon, fazendo enorme sucesso.
O gênero logo tornou-se um sucesso nacional levando o jornal Diário Carioca a afirmar: "o baião vem fazendo estremecer todo o vasto império do samba, e já agora não se poderá mais negar a influência decisiva desse gênero musical na predileção do povo".
A partir de 1950, o baião tornou-se um ritmo internacional com a música "Delicado", de Valdir Azevedo, que recebeu ao longo dos anos 50 orquestrações dos maestros americanos Stan Kenton e Percy Faith.
Em 1953, a música do filme "O cangaceiro", baseado no baião "Muié rendeira", de Zé do Norte, recebeu a menção honrosa no Festival de Cannes, na França.
Assim, até o início dos anos 60, o baião foi o gênero musical brasileiro de maior influência no exterior, perdendo essa posição apenas com a chegada da Bossa Nova.
No entanto, na década 70, em plena euforia do Tropicalismo, Gilberto Gil lançou músicas com nítida inspiração no ritmo do baião, a começar com "Domingo no Parque", com a qual participou do Festival de Música da Record de 1967.
Posteriormente, o ritmo voltou a influenciar artistas das novas gerações, como Raul Seixas, que realizou a fusão do baião com o rock, criando o baioque.

"Morena chegue pra cá
Bem junto ao meu coração
Agora é só me seguir
Pois eu vou dançar o baião
"

Segundo Tárik de Souza, no site CliqueMusic, repetindo a opinião de Tinhorão, foi Luiz Gonzaga quem imprimiu o formato urbano (e portanto pop) ao baião.
Imigrante pobre no começo da década de 40, Gonzaga passava o pires nos bordéis do Mangue carioca enquanto tocava na sanfona valsas, sambas e serestas de sucesso na época. O advogado e compositor cearense Humberto Teixeira, foi o parceiro que lhe forneceu o respaldo poético que faltava às suas composições musicais.
Ainda segundo Tárik, o sucesso de Gonzaga na empreitada foi tão grande que ele desequilibrou o eixo da MPB do meio para o fim dos anos 40 até meados dos anos 50. Antes o mercado musical brasileiro era lastreado no samba, na marcnhinha, no choro e em outros produtos musicais do centro cultural do país, o Rio de Janeiro. Assim, Gonzagão colocou, com destaque, o Nordeste no mapa da MPB. Além de Teixeira, o Rei do Baião teve outro parceiro fixo, o médico pernambucano José de Souza Dantas Filho, o Zé Dantas, falecido em 1962.

"Eu já dancei balanceio
Chamego, samba e xerém
Mas o baião tem um que
Que as outras danças não tem
Quem quiser é só dizer
Pois eu com satisfação
Vou dançar cantando o baião
"

Segundo o folclorista Câmara cascudo, citado por Tárik de Souza no site acima citado, a palavra "baião" se associava aos termos "baiano" e "rojão", este último, um pequeno trecho musical executado pelas violas nos intervalos dos desafios das cantorias.
Também reconhece no compositor cearense Lauro Maia, o antecessor de Gonzagão na utilização e formatação do ritmo, através do "balanceio". Maia foi autor de vários sucessos, entre eles "Trem de Ferro", gravado inclusive por João Gilberto.

"Eu já dancei no Pará
Toquei sanfona em Belém
Cantei lá no Ceará
E sei o que me convém
Por isso eu quero afirmar
Com toda convicção
Que sou louco pelo baião
"

Para finalizar, encontramos no site Terra Brasileira uma outra explicação para a origem do termo "baião". Segundo o site, "baião" viria de "baiano" por influência do verbo "baiar", forma simplificada de bailar, baiar, baio (baile).

Recife, 2007


-Publicado no livro Crônicas Recifenses, Recife, Clube de Autores, 2018.

2 comentários:

Marcus Prado disse...

Parabéns, um texto excelente e ilustrativo

Passiflora disse...

Pois é!
Das poucas coisas que levei comigo para a "Terra Santa" foram as lembranças do "Sitio encantado do senhor Ramos", um chapéu de couro de vaqueiro do sertão brabo e as musicas interpretadas e de autoria do inesquecível Luis Gonzaga.
Acho que foi uma escolha inocente de quem viveu ouvindo e cantando as musicas do interior nordestino.
Este seu depoimento meu caro Clóvis Campelo é uma lembrança com o cheiro da terra sertaneja entremeada com as cercas de "burra leiteira" e os "mandacarus" que quando floriam diziam que haveria bom inverno, ou o contrario. Vá saber! Pobres sertanejos.
Gostei de verdade.